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De modo geral, os indicadores de saúde dos povos indígenas na Amazônia tendem a ser piores do que as médias nacionais. Elevadas taxas de mortalidade infantil e materna e alta prevalência de doenças diarreicas, doenças do aparelho respiratório superior, malária, helmintíases, tuberculose, hepatites virais (HDB e HDV) e leishmaniose são algumas das doenças com maior frequência. As doenças infecciosas que acometem com maior frequência a população indígena também se apresentam como o maior risco de mortalidade entre eles, especialmente nas crianças. A persistência histórica de alta prevalência de doenças infecciosas, além de representar um indicador das condições de vida e proteção ambiental, expressa iniquidades em relação à sociedade não-indígena.
Outro fator importante observado nos estudos foi a dificuldade na obtenção de dados sanitários que refletissem a real situação de saúde indígena. Isso se dá porque na maioria dos países os sistemas de informação não foram desenhados para incluir a categoria “indígena” nos instrumentos de vigilância epidemiológica ou porque não há monitoramento sobre os fluxos de atendimentos à saúde percorridos pela população indígena. O Brasil é o único país que possui um sistema de informação que reúne dados sobre a saúde da população indígena. Ainda assim, uma porção considerável de registros não podem ser avaliadas pela falta de diagnóstico. Tais fatores evidenciam dificuldades para identificar a causalidade biomédica no conjunto de patologias indicadas como maior frequência na população, além de expressar a fragilidade na prática da saúde intercultural em um contexto étnico tão heterogêneo.
A ausência de diagnósticos também expressa a característica regional de difícil acesso a redes laboratoriais, hospitalares e clínicas especializadas. Além da falta de tecnologias diagnósticas para exames complementares, a região amazônica carece de protocolos e treinamentos que permitam às equipes de saúde melhor identificação de certas doenças que acometem a população, mas que permanecem sem registro. Ademais, a dispersão territorial somada a baixa frequência de acompanhamento da atenção primária em algumas localidades contribuíram para a persistência de patologias que podem ser identificadas e tratadas clinicamente, tais como a sífilis e sífilis congênita, tuberculose, parasitose, micoses e especialmente as doenças perinatais.
Além dos efeitos da doença nas pessoas, a fragilidade da atenção primária deve também ser dimensionada em seu impacto familiar e social. Há um conjunto de patologias que apenas são diagnosticadas em suas condições de maior gravidade como no caso da desnutrição, abuso de consumo de álcool e drogas, e violências familiares, comunitárias e interétnicas. Este quadro reflete múltiplas vulnerabilidades relacionadas aos processos históricos e contemporâneos de colonização e inequidade em saúde que trazem ainda outras consequências como a subnutrição, a baixa expectativa de vida e as mudanças nos hábitos alimentares.
Os povos em isolamento e contato inicial, em especial, apresentam ainda maior vulnerabilidade. Em relativo isolamento e com integridade territorial assegurada, essas populações mantêm uma relação estável com agentes de doenças infecciosas presentes em seu ambiente, num estado de equilíbrio e crescimento demográfico. Não havendo memória imunológica contra os agentes infecciosos que são corriqueiros para a população nacional majoritária e nem a imunização ativa por meio da vacinação, ao entrar em contato com populações do entorno, pode ocorrer surtos epidêmicos no grupo podendo acarretar alta mortalidade por doenças infecciosas.